#55 The keep, de Jennifer Egan
(Anchor Books, Design: Soonyoung Kwon)
Na capa abaixo, um blurb que endosso: Esse é mesmo “Um daqueles raros livros que nos fazem lembrar por que amamos ler”.
A edição brasileira, traduzida por Rubens Figueiredo, está esgotada na editora, mas pode ser facilmente encontrada em livrarias e sebos.
Após ler um ou dois capítulos de The keep, minha primeira anotação foi: “É tudo tão bizarro e fascinante nesse livro!”. Concluída a leitura, o fascínio continua.
O romance da norte-americana Jennifer Egan é uma daquelas histórias boas de serem descobertas aos poucos, então vou contar o básico do básico do enredo: De madrugada, Danny chega a um castelo localizado no interior de algum país indefinido da Europa. Logo somos informados de que seu primo Howard comprou o imóvel e quer reformá-lo e ali abrir um hotel de luxo. Danny aceita o convite para participar da empreitada. O lugar é sinistro, principalmente a torre do título, e começa a mexer com a cabeça de Danny e com suas lembranças. Será que o castelo é mal-assombrado? Será que Howard planeja vingar-se do primo por certo acontecimento vivido pelos dois na infância?
Parece um romance gótico comum, com pitadas de drama familiar, certo?
Em parte, sim. The keep é um suspense gótico moderno com todos os elementos básicos do gênero, incluindo pessoas que, mesmo assustadas, saem para dar voltas à noite pelo fucking jardim-iluminado-apenas-pela-lua-e-portanto-mega-sinistro. O drama familiar algo bem pesado, por sinal ‒ também aparece.
Mas garanto que essas camadas só arranham a superfície da história. O enredo contempla diversos temas, entre os quais imaginação X realidade, criatividade, auto imagem, culpa, perdão, e recomeços difíceis. Há ainda metalinguagem e uma alegoria do processo de escrita.
Cada camada vai se descortinando aos poucos em cada capítulo, de uma maneira que prende a atenção o tempo todo. Fiquei em dúvida se continuava lendo e saciava logo a curiosidade ou se economizava as 258 páginas da minha edição para poder me deleitar com aquela atmosfera. A solução foi ler um capítulo por dia.
O que mais me impressionou foi que, apesar de falar de tantas coisas, Jennifer Egan não se perde em nenhum momento e, portanto, o leitor também não. A autora consegue, inclusive, introduzir uma nova perspectiva na última parte do livro e manter a coerência sem tornar a história confusa nem superficial. A narrativa curta e dinâmica dá conta de conectar todos os seus elementos e demonstra domínio incrível de escrita, em especial, do gênero suspense.
Como se não bastassem todas as qualidades já enumeradas, a narrativa é cíclica ‒ ainda que não sob todos os aspectos, termina no ponto onde começou. Coisa linda de se ver! Ao terminar de ler, voltei ao início e reli alguns trechos só pelo prazer de “olhar o quebra-cabeça montado”.
Eu acredito num momento certo para tudo. Com The keep, vi acontecer na prática. O romance estava na minha estante há uns dez anos (inclusive, foi comprado na zumbi Livraria Cultura). Foi uma delícia fazer a leitura agora e me emaranhar nessa trama que eu possivelmente curtiria menos em outro momento.
Um aperitivo:
“(...) Pense no período medieval, Danny, quando este castelo foi construído. As pessoas enxergavam fantasmas o tempo todo, tinham visões ‒ elas pensavam que Cristo estava sentado com elas à mesa de jantar, achavam que anjos e demônios voavam ao seu redor. Por quê? Todas essas coisas estavam acontecendo e então pararam? É improvável. Todo mundo era maluco na época medieval? Eu duvido. Mas a imaginação delas era mais ativa. A vida interior delas era rica e estranha.”
(Página 47, Tradução minha)
Recomendo para: fãs de thriller, escritores e gente curiosa por natureza.
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